(O Estado de S. Paulo, 13) Investir em escolas em tempo
integral reduz as taxas de homicídio de jovens homens em até 50%,
segundo estudo recente de pesquisadores do Insper e da Universidade de
São Paulo (USP), com apoio do Instituto Natura. A pesquisa analisou 16
anos de uma política referência, no Estado de Pernambuco, que aumentou o
tempo de aula para 10 horas e apostou em um currículo centrado no
projeto de vida e no protagonismo do estudante. No Brasil,
diferentemente de países desenvolvidos, as crianças em geral ficam só
quatro horas na escola.
Outros estudos já haviam mostrado a melhora na aprendizagem dos
alunos em escolas de tempo integral, maiores salários para os formados,
mais empregabilidade das meninas e redução das desigualdades. Para os
especialistas, a queda na taxa de homicídios se dá não só porque o tempo
maior na escola afasta o jovem de situações arriscadas – como o
envolvimento no tráfico de drogas e outros crimes.
A qualidade da educação, com professores dedicados também em
tempo integral e currículo diferenciado, influencia muito. “Não são
apenas mais horas, é uma escola centrada no jovem, que faz ele entender a
vida de uma maneira diferente”, diz o diretor-presidente do Instituto
Natura, David Saad.
O pernambucano Vitor Arruda, de 29 anos, vinha de uma família
de agricultores analfabetos quando se deparou com a possibilidade de
cursar uma das primeiras escolas em tempo integral do Estado, em
Gravatá, a 70km de Recife. Tinha 15 anos e achava que deveria vender
frutas para ajudar a mãe, mas acabou escolhendo os estudos. “Eu não
tinha a menor ideia do que era uma graduação, se precisava de
vestibular, não tinha esse repertório.” Acabou passando em primeiro
lugar em uma universidade federal e cursou quatro graduações.
Na escola, ele diz que foi instigado a refletir “sobre seus
sonhos e sua existência”. Além das disciplinas obrigatórias, envolveu-se
nos chamados clubes de protagonismo, peças de teatro e na gestão. Os
alunos ajudavam a resolver problemas como carteiras quebradas e
alagamento de salas. “Muitos colegas que tive na infância se envolveram
com criminalidade, foram mortos. Não é romantizar, sei das dificuldades
do sistema de ensino, mas a mudança foi imensa para mim.”
Pernambuco tem hoje 70% das vagas de ensino médio em tempo
integral, o índice mais alto do País e considerado como máximo, já que
se prevê deixar unidades com um turno só, como opção. O Estado começou a
investir em 2004 e hoje todos os municípios têm uma escola integral.
Para o secretário de Educação de Pernambuco, Marcelo Barros, um dos
desafios é formar o professor para saber ensinar de uma maneira nova.
“Os jovens, principalmente os mais vulneráveis, precisam de
aprendizagens significativas para demandas do mundo contemporâneo.”
Nesse período, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(Ideb) do Estado, o indicador nacional de qualidade, cresceu. Em 2019,
as unidades que mudaram para período integral aumentaram em 21% sua
nota. Estados como Ceará e Paraíba passaram a fazer o mesmo e tiveram
resultados semelhantes.
O pesquisador do Insper e um dos responsáveis pelo estudo
Leonardo Rosa, que tem doutorado pela Universidade de Stanford sobre o
assunto, explica que a análise usou dados de 2002 a 2018 em duas
abordagens. Uma delas incluiu os municípios de Pernambuco que tinham
escola em tempo integral versus os que não tinham. O segundo grupo era
de cidades da fronteira com esse modelo comparadas às suas vizinhas de
outro Estado, que não têm. No primeiro, a diminuição das taxas de
homicídios de homens de 15 a 19 anos foi de 37,6%. No segundo, de 50,8%.
As meninas não foram analisadas. Rosa isolou efeitos de outros
programas sociais para mostrar somente a influência da escola.
“A cena da violência é muito masculina. O traficante oferece
para o menino uma trajetória de sonho sedutora, ele se vê respeitado por
mulheres, batendo de frente com o sistema”, diz o pesquisador do Núcleo
de Estudos da Violência da USP Bruno Paes Manso. “Nosso desafio é
ganhar a retórica. Seduzir pela escola, pela cultura, pelo esporte.”
Atualmente, 24% das escolas de ensino médio do País são em
tempo integral. A política começou a ser incentivada em 2016, quando o
Ministério da Educação abriu editais para os Estados se inscreverem. O
governo federal dava ajuda financeira. Mas nos últimos dois anos o
governo de Jair Bolsonaro não fez mais editais.
Os currículos são pensados para se conectar com a realidade do
estudante e desenvolver competências acadêmicas e socioemocionais. Há
projetos de orientação de estudos, tutorias, clubes de protagonismo,
práticas de laboratório. Maria Clara Araújo, de 17 anos, que fica 10
horas em uma escola estadual do Recife, diz que amigos a questionam
sobre o tempo de aula. “Não é só ficar sentada na sala, é dinâmico, com
laboratórios, disciplinas eletivas, núcleo de gênero. Não troco minha
rotina por nada.”
Segundo Saad, apesar de mais gastos, com estrutura, merenda e
funcionários com carga horária maior, a eficiência compensa. “Se Estados
como Pernambuco, Ceará e Sergipe, que não são os mais ricos, conseguem
fazer é porque é viável. O que falta é vontade política.”
Jornalista Jarbas Cordeiro de Campos
- Jornalista Jarbas Cordeiro de Campos - Pós Graduado em GSSS - Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde.
- Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
- Jornalista formado pela FAFI-BH,especializado em Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde pela ESPMG. "O Tribunal Supremo dos EUA decidiu que "só uma imprensa livre e sem amarras pode expôr eficazmente as mentiras de um governo." Nós concordamos."
16 junho 2022
EDUCAÇÃO INTEGRAL REDUZ EM 50% OS HOMICÍDIOS, DIZ ESTUDO!
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