A DIPLOMACIA PRESIDENCIAL!
(Oliver Stuenkel, analista político e professor de relações
internacionais da FGV/SP - O Estado de S. Paulo, 05) Nos primeiros cinco
meses de governo, o presidente brasileiro obteve uma série de êxitos
notáveis na política externa. Em meio a um alívio generalizado com a
saída de Jair Bolsonaro em capitais mundo afora, a mensagem de Lula de
que o Brasil “está de volta”, articulada durante a COP-27, no Egito, em
novembro do ano passado, surtiu efeito: o governo brasileiro conseguiu
normalizar suas relações com seus os principais parceiros e ainda obteve
promessas de importantes aportes financeiros para apoiar o país no
combate ao desmatamento da Amazônia.
Mesmo sendo conquistas relativamente fáceis – conhecidas no
jargão diplomático como “low-hanging fruit”, é inegável que Lula, uma
das lideranças políticas mais conhecidas do mundo, teve papel importante
no processo de consolidar a narrativa da normalização para o público
global.
No mês passado, porém, o presidente gerou vários desgastes
desnecessários que apontam os riscos da diplomacia presidencial. Afinal,
com apenas uma frase, um chefe de Estado pode desfazer o trabalho de
meses de sua equipe diplomática. O caso da Ucrânia é emblemático.
RISCO. A ideia de Lula de que o Brasil poderia participar de
uma possível mediação no conflito em decorrência da invasão russa não é
problemática em si. No entanto, vem causando fricção a forma errática
como o presidente brasileiro tem conduzido a política externa em relação
ao conflito.
Em vez de promover o diálogo a portas fechadas e testar
diferentes ideias nos bastidores, Lula fez inúmeras declarações públicas
que causaram consternação no Ocidente – e particularmente em Kiev. Por
exemplo: ao sugerir publicamente que a Ucrânia ceda a Crimeia aos russos
para negociar a paz – sem averiguar primeiro, a portas fechadas, como a
proposta seria recebida –, prejudicou sua própria imagem, reduziu as
chances de o Brasil ser aceito por Kiev como mediador e gerou tensões
facilmente evitáveis com os EUA e vários países europeus.
O presidente turco, Recep Erdogan, por outro lado, atuou de
forma mais discreta, mas com papel-chave, na negociação entre Kiev e
Moscou por um acordo que permita a exportação de grãos ucranianos.
NOVA FASE. Outro desgaste desnecessário se deu na semana
passada, quando uma série de comentários desastrados de Lula sobre a
situação na Venezuela – inclusive exaltando a “legitimidade democrática”
de Maduro – contaminou a cúpula dos líderes sul-americanos e obrigou os
presidentes do Uruguai e do Chile a se distanciarem publicamente da
visão do presidente brasileiro. O anfitrião, que havia organizado o
encontro justamente para reconstruir pontes e fortalecer a convergência,
fez com que a reunião fosse lembrada pela falta de consenso.
Agora que a lua de mel diplomática do governo brasileiro
acabou, os próximos desafios externos serão bem mais complexos – e o
custo de errar aumentará. No âmbito dos Brics, o Brasil sofrerá pressão
imensa por parte de China e Rússia, interessadas em ampliar o grupo para
formar uma aliança antiocidental, algo que não é do interesse
brasileiro.
Declarações favoráveis à adesão da Venezuela aos Brics, feitas
por Lula no calor do momento, terão um custo estratégico alto se
ocorrerem no âmbito da cúpula do grupo, pois vão contra os esforços do
Itamaraty de manter a exclusividade do grupo. Para o Brasil, fazer parte
de um Brics diluído, com integrantes menos relevantes, virando uma
espécie de G-77, representaria imensa perda de prestígio.
Com as eleições argentinas se aproximando, assessores
diplomáticos de Lula terão de fazer de tudo para convencê-lo a não
repetir os erros de Bolsonaro e fazer comentários públicos a favor ou
contra os candidatos no país vizinho, pois pode estragar a relação com
quem quer que vença o pleito, mesmo antes da posse.
Tradicionalmente, desafios políticos internos atrapalham a
condução da política externa, pois demandam muita dedicação e energia
dos mandatários.
CHANCELER. No caso do governo Lula, porém, as recentes tensões
entre Planalto e Congresso podem, paradoxalmente, ter um impacto
positivo: com o presidente mais ocupado em Brasília, aumenta a chance de
o chanceler Mauro Vieira ter mais controle da política externa e
reduzir o risco de desgastes desnecessários.
Um dos diplomatas mais experientes de sua geração, Vieira é
conhecido por seu profissionalismo e discrição, atributos relevantes
para a política externa brasileira neste momento.
Jornalista Jarbas Cordeiro de Campos
- Jornalista Jarbas Cordeiro de Campos - Pós Graduado em GSSS - Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde.
- Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
- Jornalista formado pela FAFI-BH,especializado em Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde pela ESPMG. "O Tribunal Supremo dos EUA decidiu que "só uma imprensa livre e sem amarras pode expôr eficazmente as mentiras de um governo." Nós concordamos."
06 junho 2023
A DIPLOMACIA PRESIDENCIAL!
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