Os trapalhões
Por Rodrigo Constantino, para O Globo
Sou uma
pessoa nostálgica. Uma das boas lembranças que tenho de minha infância é
ficar no colo do meu falecido avô assistindo “Os Trapalhões”. Eu
adorava. É por isso que devo agradecer ao governo Dilma por resgatar
lembranças tão doces de minha vida. Acompanhar os atos de seus ministros
é voltar no tempo, é como ver as trapalhadas da turma do Didi.
Comecemos
pelos malabarismos contábeis que o governo fez para apresentar o
superávit fiscal de 2012. A coisa foi tão primária que faria um mágico
de festa infantil ruborizar diante do amadorismo. Poderiam ao menos ter
chamado um David Copperfield para ajudar a esconder as peripécias!
O
ministro Mantega é imbatível. Sua declaração sobre a taxa de câmbio
comprova: “O câmbio é flutuante, mas, se exagerar na dose, a gente vai
lá e conserta.” Ou seja, o câmbio flutua, desde que na direção do valor
que o governo considera “correto”.
Na mesma linha, o ministro
Lobão (não confundir com o músico inteligente) nos brindou com essa
pérola ao falar sobre o aumento da gasolina: “O mercado é livre, mas não
deve exceder o limite do razoável.” Traduzindo: o mercado é livre,
desde que coloque o preço que eu considero razoável.
Quem precisa
de preços tabelados quando se tem uma “liberdade” dessas? O governo
Dilma demonstra a cada dia seu forte ranço intervencionista. Pretende
controlar toda a economia. Triste o país em que os preços mais
importantes são todos decididos pelo governo!
Mas o nexo causal
nunca foi o forte dessa equipe econômica. Eles acreditam que a economia
ainda não se recuperou a despeito de suas fantásticas medidas. Não passa
por suas brilhantes cabeças que é justamente o contrário: a economia
patina e a inflação sobe por causa do governo!
Os investidores
estão assustados com o grau de intervenção arbitrária. Também, pudera: a
presidente usa seu poder para criar “campeões nacionais”, enquanto
todos os privilégios e subsídios concedidos acabam prejudicando o
restante, longe das graças estatais. O cobertor é curto. Para ajudar os
“amigos do rei”, o governo tem destruído setores inteiros.
Basta
ver o que aconteceu com o setor elétrico. As estatais foram dizimadas em
bolsa, pois o governo, com foco no curtíssimo prazo, decidiu dar mais
uma ajudinha aos industriais. Quem, em sã consciência, investiria em
geração de energia em um cenário desses?
Mas isso não impediu a
presidente de fazer propaganda eleitoral, anunciando a queda das tarifas
e abusando do ufanismo boboca: quem critica a medida está contra o
país!
A Petrobras tem sido utilizada para fins políticos desde o
começo da gestão petista. O governo segura o preço da gasolina defasado
para não impactar as taxas de inflação. Faltam recursos para a estatal
investir, e sua ineficiência cria a necessidade de importação de
combustível.
O Brasil perde, mas nunca se esqueçam de que “o petróleo é nosso” e a Petrobras é motivo de “orgulho nacional”.
Curiosidade:
por que a presidente não fez uso da rede nacional de rádio e televisão
para comunicar ao povo o aumento da gasolina, como fez para anunciar a
queda das tarifas de eletricidade? Pergunta retórica, claro. Sabemos a
resposta.
Mas o governo tem cartas na manga para conter a
“inflação” (na verdade, o índice oficial, não a inflação verdadeira). A
gasolina aumentou? Então basta aumentar a parcela de etanol na sua
composição, diluindo o efeito. Se o próximo vilão for o feijão, já
sabemos qual a solução: basta acrescentar mais água na feijoada!
Não
devemos ficar surpresos com tais trapalhadas, quando lembramos que a
Argentina é admirada por nosso governo, e que Delfim Netto é bastante
influente na economia. Aliás, Delfim influencia nossa economia há
décadas, sempre perto do poder. É uma espécie de Sarney da economia. O
Brasil idolatra o fracasso.
O resumo da ópera bufa? Não temos mais
câmbio flutuante, a Lei de Responsabilidade Fiscal foi abandonada, a
inflação ameaça sair de controle, os bancos públicos criaram uma bolha
de crédito, a inadimplência aumentou, os investimentos não vêm e a
economia não cresce. Promissor?
O crescimento dos últimos anos,
que já foi medíocre, teve boa ajuda externa. Tanto que nossa
produtividade não aumentou quase nada. Tivemos um empurrão da alta das
commodities. Isso acabou. E agora? Como crescer com esses trapalhões no
governo?
Eu achava graça nas piadas dos Trapalhões. Elas eram
inofensivas, ainda que politicamente incorretas para nossos padrões
chatos de hoje. Mas as trapalhadas do governo não têm a menor graça.
Elas vão custar muito caro ao Brasil.
Rodrigo Constantino é economista